terça-feira, 24 de maio de 2011

A professora Amanda Geugel na luta por seus direitos

                                

DEPOIMENTO DA PROFESSORA AMANDA GURGEL, NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, EM DECORRÊNCIA DE AUDIÊNCIA PÚBLICA COM A PRESENÇA DA SECRETÁRIA ESTADUAL DA EDUCAÇÃO E DOS DEPUTADOS ESTADUAIS, REALIZADA PARA DISCUTIR OS PROBLEMAS DA EDUCAÇÃO NO ESTADO, DIANTE DA GREVE DA EDUCAÇÃO.
“Bom dia a todos e todas! Durante cada fala aqui, eu pensava em como organizar a minha fala, porque são tantas questões a serem colocadas. São tantas angustias no dia-a-dia de quem está em sala de aula, de quem está nas escolas, e eu gostaria pelo ao menos sintetizar minimamente essas angústias. Mas também como as pessoas apresentam muitos números e como sempre colocam os números como irrefutáveis, eu gostaria também de apresentar um número, pra iniciar a minha fala, que é um número composto por três algarismos apenas, bem diferentes dos outros números que foram apresentados aqui com tantos algarismos, que é o número do meu salário; nove, três, zero, meu salário base, novecentos e trinta reais, com nível superior e especialização. E ai eu gostaria de fazer uma pergunta a todos e todas que estão aqui, se vocês conseguiriam, sobreviver e manter o padrão de vida que vocês mantém com esse salário,certamente esse salário não seria suficiente pra pagar nem a indumentária que os senhores e as senhoras utilizam pra poder frequentar essa casa aqui. Então... A minha fala não poderia de deixar de partir de um ponto desses, pois só quem está na sala de aula, só quem está pegando três ônibus por dia para poder chegar ao seu local de trabalho, ônibus precário, inclusive, é quem pode falar com propriedade sobre isso. Fora isso, qualquer colocação que seja feita aqui, qualquer consideração que seja feita aqui, é para mascará uma verdade visível a todo mundo, que o fato de que, em nenhum governo, em nenhum momento que nós tivemos no nosso estado, na nossa cidade e no nosso país, a educação foi uma prioridade.
Preocupa-me muitíssimo as falas da maioria aqui, inclusive da secretária Betânia Ramalho, com todo respeito, que é _ “Não vamos falar da situação precária porque isso, todo mundo já sabe” _ Como assim, não vamos falar da situação precária? Nós estamos banalizando isso daí... Estamos aceitando a condição precária da educação como uma fatalidade. Estão me colocando dentro de uma sala de aula, com um giz e um quadro, para salvar o Brasil, é isso? Salas de aulas superlotadas, com os alunos entrando a cada momento com uma carteira na cabeça porque não têm carteira nas salas. Sou eu a redentora do país? Não posso, não tenho condições. Muito menos com o salário que eu recebo.
A secretária disse que não podemos ser imediatistas, e que precisamos pensar em longo prazo, mas a minha necessidade de alimentação é imediata. A minha necessidade de transporte é imediata. A necessidade de se ter uma educação de qualidade é imediata. Então, eu gostaria de pedir aos senhores, que se libertem dessa concepção errônea e extremamente equivocada, e isso eu digo com propriedade porque sou eu que estou na sala de aula, inclusive com propriedade maior até, do que os grandes estudiosos... Parem de associar a qualidade da educação com o Professor dentro da sala de aula. Não tem como você ter qualidade na educação com Professores em três horários na sala de aula. É assim que os Professores multiplicam seus novecentos e trinta reais... Novecentos e trinta pela manhã, novecentos e trinta à tarde e novecentos e trinta à noite pra poder sobreviver. Não é pra andar com bolsas de marcas nem pra usar perfume francês, é pra ter condições de pagar a alimentação de seus filhos. É pra ter condições de pagar a prestação de um carro que muitas vezes compramos pra nos locomovermos mais rapidamente entre uma escola e outra, e que é preciso escolher o dia em que vai andar no carro porque não tem condições de comprar o combustível. A realidade, o cenário da educação no Rio Grande do Norte hoje, é esse... E eu não me sinto constrangida em apresentar o meu contracheque, nem a meus alunos, nem a Professor, nem a nenhum dos senhores aqui, porque eu penso que o constrangimento deve vir de vocês. Sinto muito e lamento, mas penso que todos devem está constrangidos... Sempre o que se solicita da gente é paciência, é tolerância, e eu tenho colegas que estão aguardando pacientemente há quinze anos, há vinte anos, por uma promoção horizontal. Professores que morrem e não recebem sua promoção. Então eu quero pedir a secretária, em primeiro lugar, paciência também, porque nós não aguentamos mais esse discurso. O que nós queremos é objetividade. Queremos sair desse impasse? Queremos, mas como? Sem nenhuma proposta, de mãos abanando? Voltarmos mais uma vez pra sala de aula pra o aluno dizer _ “Professora ficamos aqui sem aula, e só isso? Vocês receberam vinte reais, trinta reais de aumento, e dão risadas?”
Pedimos ainda secretária respeito Para que a senhora não vá mais à mídia e dizer assim _ “pedimos flexibilidade”. Como se nós fôssemos os responsáveis pelo caus, que na verdade só se apresenta pra a sociedade quando nós estamos em greve, mas que estão lá, todos os dias, dentro da sala de aula, dentro da escola e de todos os lugares. Então, não se refira a nossa categoria dessa forma... Pedimos aos deputados, apoio... Procurem ouvir os trabalhadores. Procurem saber a realidade. Pedimos ao ministério público que esteja com a fiscalização mais efetiva, Que não seja apenas pra dizer que o Professor não pode comer do cuscuz nem da merenda escolar, porque a promotoria está para dizer que a merenda é do aluno e não do Professor... É assim que funciona...
(...) Em nome dos meus colegas que comem o cuscuz alegado. Em nome dos meus colegas que pegam três ônibus para chegar ao seu local de trabalho... “É isso que eu quero dizer”.
Assinado
Amanda Gurgel – Professora.

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